segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Desempenhando papéis, por Camila Nunes


Vemos a cada dia aumentar a busca pelo autodescobrimento. Mais e mais pessoas no mundo voltam a sua atenção para dentro numa frenética e constante inclinação, advinda não se sabe ao certo de onde, mas que as impelem a questionarem sobre a sua própria origem, sobre o porquê de estarem aqui e para onde se irá quando for chegado o momento. Nas ruas inúmeros cartazes alertam para o retorno do Mestre, notadamente os de conteúdo protestante; arquivos oficias outrora secretos, agora nos são revelados por variados governos no mundo; há pouco, o Vaticano declarou através de seu canal oficial a existência de vida extraterrestre. Os fatos são tantos e inéditos que num passado próximo não se vislumbrariam tais ocorrências senão em sonhos. E tudo ocorre com uma velocidade inacreditável.
Ditos fatos e muitos outros, dizem a Espiritualidade, sinalizam apenas o fim de uma era e o começo de outra. Há mais de 5 mil anos os toltecas já previam essa inclinação da humanidade para a busca da espiritualidade, registrando suas observações no calendário astronômico, posteriormente denominado de calendário maia, um legado daquela civilização para esta que se imortalizou nas areias do tempo.
Mas o que é ser alguém espiritualizado? E o que é ser alguém espiritualista?
Parecem perguntas difíceis, mas não são.
Há inúmeros conceitos arraigados no consciente coletivo que levam a distinguir alguém espiritualizado de outrem que não seja tanto ou que não seja de jeito nenhum. Um deles é alguém se comportar de maneira mansa, tranqüila, não beber, não fumar, não sair...levar uma vida de renúncias e abnegações por vezes vividas de forma prazerosa, por vezes tortuosas, mas aparentemente praticadas.
E vão rotulando essa ou aquela pessoa com o status de iluminado e visualiza-se em torno dessa figura uma auréola daquelas concedidas aos santos.
Criam e recriam parâmetros com base em referências terrenas e se satisfazem com elas. Passam pela existência como se uma vida imaculada tivessem vivido e não se atentam para as possíveis surpresas que advém quando se descobre que se viveu uma vida que não era a sua própria. Quão grande sofrimento é dar-se conta de que a vergonha de ter sido quem era, impediu de acender a luz que passou a vida inteira acreditando ter despertado ou tentando fazê-lo.
Muitos são os que fogem de sua realidade interior. Poucos são os que assumem o que vêm e não buscam esconder-se dos outros.
Esta não é uma carta aberta ao mal, à prática desenfreada de nossas tendências e inclinações. É um alerta a necessidade imperiosa de percebê-las, compreendê-las, e permiti-las ou não, conforme o caminho que o ser decidir trilhar.
Para se reformar uma casa é necessário conhecer a sua estrutura, os pontos de fragilidade, aqueles que podem ser mexidos sem comprometer as demais, e traçar um plano. Por onde começar a reforma, o que se vai reformar, se ela toda ou parte dela, os materiais a serem empregados, quanto se irá gastar e o tempo necessário à consecução da obra.
Da mesma forma se processa a reforma em nosso interior. Cada tendência deve ser criteriosamente analisada a fim de se perceber a necessidade de mantê-la ou substituí-la. Os pontos principais também devem ser escolhidos como tais. O exercício da tolerância, a aceitação e a paciência com aquilo que ainda não pode ser alterado, seja por razões de apego, maturidade, ou simplesmente por uma questão de prioridade, têm importância primordial neste processo.
As pessoas querem reformar-se de vez e não dão conta que o processo é lento. Exigem mudanças bruscas e não aceitam mais certas tendências que passaram milhares de anos a cultivarem carinhosamente pela repetição de hábitos em seu interior, exigindo de maneira violenta a sua retirada imediata.
E assim vão vivendo desempenhando papéis; de mãe, de pai, de irmão, de amigo, de filho, de alguém espiritualizado ou em vias de sê-lo, enfim. Inúmeros são os papéis e vários são os cenários para representá-los, todavia, esquecem-se de representar o papel mais importante na história pessoal de cada um, o de ser o SER cujo papel assume ou, utilizando o trocadilho, assumir o ser por trás do personagem representado.
Pare e escute o silêncio que dele emana. Sinta a sua voz expressa no silêncio que há por trás de tudo que você conhece ou pensa saber. Você é alguém que a sua própria consciência desconhece. O seu maior papel é descobrir-se atrás dos bastidores de sua peça teatral. Olhá-lo de frente e reconhecê-lo por inteiro; aceitar e amar o espectro que surge, opaco e encolhido de tanto ser escondido.
Descobrir-se é o primeiro passo para alguém que busca o caminho da iluminação. Este talvez seja o papel mais difícil de ser encenado; também o mais glorioso, eis que conduz ao regozijo perene semelhante ao que sente o descobridor de um grande tesouro.
Mostrar-se sem receio de julgamentos. Assumir-se como individualidade em construção. Reconhecer as virtudes e expressá-las; olhar para as virtudes ainda não conquistadas e esforçar-se por adquiri-las. Não temer em expressar-se; primeiro passo da escalada da melhora íntima.
Não há como Espiritualizar-se violentando a si mesmo com mudanças bruscas de hábito impostas meramente por ordenações partidas do cérebro físico. Informação e consciência são coisas completamente diversas. De nada adianta a renúncia se ela violenta ao renunciante. As mudanças devem partir de uma sugestão amorosa advinda da consciência e não de uma mera tentativa cerebral em se adequar a parâmetros considerados corretos. Isto vale para todos os níveis. Há que se ter prudência e imposição de limites, mas sobretudo discernimento e autoamor suficientes para se saber até onde vai este “limite”.
A cada tentativa verifica-se que o “limite” expande-se. E quando menos se espera o corpo está pronto para a prática dos anseios da alma.
Olhem para dentro enquanto vivem e dêm passos suportáveis às suas próprias pernas. No entanto, exercitem-se diariamente para que estas pernas adquiram cada vez mais resistência a fim de que em breve possam não só darem grandes passos, mas pularem em direção ao despertar da consciência.

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